#DifraçõesHistóricas

Uma escrita da História no tempo das contingências

Água como recurso e a força dos corpos aquosos

 

Por ocasião do Dia Mundial da Água, anualmente celebrado no dia 22 de março, a ONU lançou um relatório sobre desenvolvimento de recursos hídricos. O tema do relatório desse ano é Água e Emprego. Um resumo dos principais pontos abordados no relatório e um link para o próprio texto pode ser acessado aqui.

Quando recebi esse link e li os pontos abordados no relatório da ONU, imediatamente notei a força que os corpos de água vão adquirindo com o passar dos anos. Força tanto no sentido de ser “recurso” indispensável à manutenção da vida e atividades humanas, quanto força no sentido de presença, protagonismo na sociedade e na cultura ocidental. O mais interessante é notar que quanto mais se intensifica o “uso” das águas, quanto mais se reforça o status de “recurso” de determinados corpos de água, maior é o seu protagonismo, afetando milhões de pessoas no planeta. A mercantilização da água, a sua instrumentalização pela indústria, agronegócio, mineração e outras, ameaça as reservas de água potável, mas reforça a dependência econômica e social para com os corpos hídricos ao conformar novas e mais intensas relações para além das necessidades biológicas do corpo.

É um paradoxo. Quanto mais a água é entendida como recurso, maior o seu protagonismo social, afetando a geração de empregos, as políticas públicas, a saúde das populações, promovendo temores, misérias, ficções sobre um mundo afetado por desastres, dentre muitos outros aspectos da vida humana. Essa condição também afeta a vida de insetos, animais, vegetais e diversas estruturas do ambiente onde os humanos estão imersos em íntima coexistência. Tratar os corpos de água como “recurso” os fortalecem em suas agencias. A narrativa do domínio sobre os recursos hídricos perde, assim, o seu sentido. O que existe são relações. Relações essas que colocam em risco a sociedade e as formas de vida humana como nós as conhecemos.

A narrativa da água como recurso, bem como de domínio e destruição de recursos hídricos pode ser substituída por uma narrativa relacional. As mudanças climáticas e a escassez de água em várias partes do planeta indicam que os corpos de água não são entidades miseráveis a espera de humanos que a gerenciem melhor. Água não é recurso passivo. Água é agente ativo e com força suficiente para promover dramáticas transformações sociais. Uma das questões centrais, portanto, deve ser a análise das relações econômicas e sociais com os corpos aquosos e até que ponto e quais as atividades humanas são responsáveis diretas e indiretas pela produção de pobreza, doenças e escassez. Enquanto água for sinônimo de recurso, dificilmente haverá um debate consistente, pautada em uma ética relacional, de modo a promover mudanças necessárias para a manutenção das condições de variadas formas de vida humana no planeta.

 

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Publicado às 23 de março de 2016 por em Curiosidades provocativas e marcado , .
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